Territórios e práticas libertárias em redes sociais –Geopolítica do (des)conhecimento

  

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Territórios e práticas libertárias em redes sociais –Geopolítica do (des)conhecimento
 – 3 de dezembro de 2012
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Editorial
Tatiana Wells e Adriano Belisário“Es necesario desprenderse de las vinculaciones de la racionalidad-modernidad con lacolonialidad, en primer término, y en definitiva con todo poder no constituido en la decisionlibre de gentes libres.” Anibal Quijano, “Colonialidad y Modernidad/Racionalidad”
Esta investigação foi despertada pela recente emergência global de marchas, mobilizações eocupações das praças e das ruas sendo organizadas através da internet, em especial os ciclosque se iniciam a partir da chamada “Primavera Árabe”, se espalhando durante 2011 pelaEspanha e o restante da Europa para o Brasil e o mundo.De fato, desde os anos 1990, diversos movimentos utilizam a internet como ferramenta paraação política, como os Zapatistas no México, ou o blog Centro de Mídia Independente (RedeIndymedia). No entanto, esta apropriação ocorreu de diferentes maneiras, destacando-se dasmanifestações recentes o uso intensivo de plataformas proprietárias de empresasestadunidenses, como Google, Facebook e Twitter.À semelhança da pirataria de programas de computador, as redes sociais proprietáriaspopularizam o uso (e a dependência) das ferramentas, no entanto, concentram em poucasmãos o desenvolvimento das mesmas. Assim, quanto mais as redes sociais proprietárias sãoutilizadas, mais se fortalecem como um mecanismo de controle sobre a vida e as relaçõeshumanas, não somente padronizando mercadologicamente sua forma de se relacionar comuma amiga, família ou certo tema, mas também estabelecendo-se como poderososoligopólios da comunicação global.Discutiremos nesse texto diferentes formas de apropriações tecnológicas por parte dosmovimentos sociais que utilizam redes de relacionamento virtuais, demonstrando que autilização de plataformas proprietárias muitas vezes pode ser um erro tático, configurando-secomo um empecilho para a consolidação de uma cultura livre na Internet.Para isso, reunimos os exemplos mais notórios das estratégias usadas por estas corporaçõesda comunicação, como: censura prévia, bloqueio do compartilhamento de arquivos com
 copyright 
, exclusão de informações consideradas inapropriadas e colaboração com órgãos dogoverno em ações contra ativistas. Por outro lado, apresentaremos algumas experiências deredes sociais livres ou federadas, que se utilizam das mesmas tecnologias digitais parapromover a autogestão, a cultura livre e aberta, a segurança dos dados, o fortalecimento decomunidades colaborativas e a des-mercantilização das informações e dos afetos.Sabemos que a internet ou as tecnologias de comunicação em si não afastam as pessoas. Nasmanifestações recentes, elas foram compelidas a irem às ruas graças aos chamados nas redessociais. De fato, pipocam as revoluções 2.0. No entanto, inseridas em espaços decomunicação totalmente comerciais e proprietários, estas articulações acabam colaborandotambém com uma engrenagem de vigilância e captura das subjetividades, sem promover umaruptura profunda de paradigmas no campo da comunicação e cultura em rede.Do outro lado do
 front 
, as redes livres contribuem com um modelo de envolvimento afetuosoe abundante, retomando a autonomia e uma postura crítica – tanto política quanto poética –sobre a tecnologia. Usam as infra-estruturas físicas comerciais de conectividade (satélites,
 
celulares, cabos de fibra ótica, etc), mas criam uma carapaça libertária, uma re-apropriaçãonos nós de suas redes lógicas (programas e servidores livres).Uma boa definição dos princípios das Redes Livres é a do manifesto de Redes Livres Latino-Americanas, lançado no Fórum de Software Livre de 2011 [1]:
“Dado o estado atual da rede das redes, a Internet, que é operada e controladamundialmente por um pequeno número de corporações internacionais cuja motivação principal é meramente econômica; e considerando que as implicações que isto tem nodesenvolvimento da rede das redes, os membros e ativistas das Redes Livres manifestam queuma rede livre é aquela rede informática que é construída e administrada colaborativamente pelos próprios usuários e apresenta, no mínimo, estas características:garantia à descentralização e evitar a monopolização de recursos, a coerção ou a opressão;respeitar a neutralidade da rede; garantia ao acesso público e livre; sua estrutura é de rededistribuída onde o crescimento é possível a partir de qualquer ponto existente; ainterconexão se realiza entre pares que podem publicar ou receber serviços e conteúdos emigualdade de condições; promove a criação de outras redes livres, sua interconexão einteroperabilidade.”
Outro exemplo de rede aberta é o Movimento dos Sem-Satélite [2], uma rede global deartistas, ciberativistas, desenvolvedores de software e hardware livre e cientistas amadoresque atestam em seu manifesto o amplo campo para o qual se lançam:
“Comunidade de artesãos de bits e volts, poetas humanistas, cientistas nômades, para ondeestamos indo? Confio no pulso dos seus passos, nossa revolução é o próximo segundo e odesafio constante de não render-se ao conformismo de simplesmente entreter-se ou entreter,distraindo o fato de que vivemos além da história, dos muros, dos bancos, da semelhançados corpos e suas consagüinidades. Queremos um ecossistema condizente com toda esta pirotecnia prometéica de um suposto Sapiens, uma simbiose duradoura e enfim poder pensarem criar e imaginar outros espaços e formas para todo esse conhecimento que mantemosaceso nesta chama. Mas se ainda hoje nossos semelhantes marcham por um pedaço de chão para sobreviver, outros alienam seus instintos mais criativos em busca de algumreconhecimento dentro de uma esmagadora cultura de consumo auto destrutivo, nosdeparamos com a questão: qual o papel que nós aqui já alimentados e abrigados temos em pensar numa soberania deslocalizada? E na transmissão de conhecimentos que buscamreverter esta pulsão auto destrutiva da humanidade? A conjectura deste manifesto é emfunção de apontar uma faísca rachando no horizonte: Criaremos nosso primeiro satélitefeito à mão e mandaremos ao espaço sideral entulhado de satélites industriais corporativose governamentais.Será nosso satélite capaz de tornar nossas redes ainda mais autônomas?Ou o caminho é repensar e mapear toda atual estrutura de nossa tecnocracia e ciência a ponto de decidirmos estratégicamente um caminho totalmente diferente? Qual?? Muito maisque cobaias da Tecnocracia! Sonhando e Dançando: marcham os Sem-Satélite.”
Ambas iniciativas colocam sob outra perspectiva o uso e o terreno político-cultural das novastecnologias de comunicação. Ambos movimentos deslocam e revelam um campo de lutasaparentemente inócuo, mas que está presente em toda a nossa vida contemporânea.Principalmente a terceiromundista. Questionam os mesmos oligopólios globais deinfocomércio, publicidade, regulação e vigilância, propondo na prática territórios e fazereshorizontais em prol de bens comuns.Pensando em redes sociais, certas questões são importantes neste contexto. O uso dasplataformas proprietárias estaria sendo feito por falta de opções livres ou pela influência dosusuários das ferramentas proprietárias? Quais as consequências de um uso acrítico destasplataformas? É possível fazer uma migração de certos grupos para plataformas abertas, pelomenos os que podem sofrer algum tipo de censura ou vigilância através dos sistemascomerciais? É possível utilizar de forma tática as ferramentas proprietárias?
Do jardim ao shopping
 
No caso das redes sociais proprietárias, as diferentes empresas competem entre si pelo tempoe a atenção das pessoas, nossos maiores recursos não-renováveis, traduzindo-os em seufaturamento mensal através da venda de certos serviços pagos e a ocupação deste tempo deseus usuários com anúncios e propagandas. Longe de realizar a utopia da descentralizaçãodos discursos, os oligopólios do capitalismo cognitivo são ainda mais fortes no caso dasmídias eletrônicas, inclusive extrapolando-as. Neste sentido, é notório o exemplo do Google,que possui braços na biotecnologia, intra-estrutura da internet, eletricidade, patentes,software, hardwares, entretenimento digital, notícias, bibliotecas, o espaço sideral e o códigogenético [3].O Brasil aparece como um dos mais cobiçados clientes neste novo sistema de circulação docapital e do conhecimento, o chamado capitalismo cognitivo. Quase 60% do tráfego na redesocial Orkut é brasileiro [4]. E de aproximadamente 800 milhões de usuários conectados aosistema Facebook, 21 milhões são brasileirxs. Se consideramos que o número médio debrasileirxs conectados à Internet é de 41 milhões, praticamente a metade delxs usamFacebook, uma a cada duas pessoas conectadas. [5] Mesmo com um sólido movimento pró-software/rádio/mídia-arte livre em curso próprio, movimentos como Metareciclagem fazendo10 anos, ainda não conseguimos popularizar no Brasil a
 
prática da liberdade – os fazereslivres. Afinal a informática é uma manualidade como outra qualquer. Quanto mais livre, maisartesanal e comunitária. Essa é a nossa digitofagia (Ricardo Rosas). O software livre nuncapassará de uma questão meramente técnica se não for vivida como atividade colaborativacotidiana.A diretora de tecnologia do grupo
 OpenDemocracy
, Becky Hogge aponta algumas reflexõessobre as redes proprietárias no texto ‘A nuvem da liberdade’, publicado na Revista PoliTics:
“O Facebook é uma hierarquia, e não uma rede. O Twitter é uma hierarquia, e não umarede. O Gmail é uma hierarquia, e não uma rede. Sim, aqueles de nós que utilizam essasferramentas são “rede”: somos, como os utópicos diriam, livremente associados. Mastambém estamos fundidos com os gigantes corporativos que fornecem e lucram com essasferramentas, por cujos servidores passam nossas trocas mais íntimas ou banais. A Web 2.0,assim como fez a “terceira via” de ambiciosos líderes políticos de centro-esquerda nadécada de 1990, traiu seus primeiros ideólogos puristas e passou a cortejar o mercado. [… ] Em vez de uma exposição total aos perigos e armadilhas da natureza humana, passou aoferecer uma série de jardins murados, cuidadosamente cultivados e livres de ervas daninhas[…] inscritos com os nomes de seus criadores: Twitter, Facebook, Bebo e MySpace. Elestornaram-se insanamente populares, e em muitos casos tornaram podres de ricos os seustranquilos proprietários, no Vale do Silício.”
[6]A pesquisadora cita ainda alguns dados, atribuídos à empresa Arbor Networks: quase 60% detoda movimentação na Web converge para aproximadamente 150 empresas. 30% deste totalvai para apenas 30 empresas: Google, Facebook, Twitter e outras seletas organizações. Trata-se de um “efeito Mateus” [7] que confere um enorme poder a estas empresas de controlar omodo como nos relacionamos com as informações publicadas na Internet, através dealgoritmos que analisam padrões comportamentais para então priorizar conteúdos que sãoconsiderados os mais indicados para aquela pessoa. Criam-se assim bolhas informacionais deacordo com perfis de usuárixs/consumidorxs. Deste modo, uma mesma busca pode retornardiferentes resultados, de acordo com os interesses políticos e econômicos que sãoimplementados através destes sistemas de filtragem de conteúdos. [8]O conceito de jardins murados surge para dar conta das práticas técnicas de controle dainformação operadas dentro deste cenário. A analogia é utilizada para demonstrar como asrestrições de acessos não-aprovados pelo administrador de um serviço, como é o caso desítios e redes sociais que não permitem a interoperabilidade ou exportação dos dadosinseridos dentro de seus sistemas (como por exemplo tornar públicas, ou pelo menos nãomediadas por registro, as comunidades criadas, ou ainda exportar facilmente conversas paraum blog pessoal). Dessa forma, todo usufruto das informações baseadas no conhecimento ou

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