Ághata
Imagem do DCM. |
Por: Sandra Raquew Azevedo
Professora de Comunicação e Jornalismo da UFPB.
(Segue coluna publicada nesta quinta-feira, no Jornal A União: Ághata)
Nos últimos tempos tenho procurado evitar, o quanto posso, as redes sociais. Por muitos motivos: trabalhos para concluir, textos para escrever, deslocamentos diante da correria do dia, não querer condicionar meu tempo a estar autômata frente a uma tela. Entretanto a própria lógica de uma sociedade que se organiza atualmente pelo processamento de símbolos pela tecnologia, nos faz vez por outra tocar a tela e abrir-se à navegação. Foi passando a tela com um dedo que tomo conhecimento da morte da menina Ághata Vitória Sales Felix, 8 anos, baleada e morta no Complexo do Alemão.
Esse tipo de informação fere. Dói muito. Fiquei espantada ainda por perceber uma certa inércia social e silenciamento, diante de mais uma morte violenta, que passa, cada vez mais, a ser percebida socialmente como estatística. Ou nada além de uma crescente numérica. Talvez a dificuldade de mobilização social para enfrentar questões como esta seja um forte sintoma de anomia, de declínio da organização social e da condição do Estado de garantir proteção.
Porque na verdade, no cotidiano eu percebo muita comoção e engajamento das pessoas pelos times de futebol, pela dança que virou febre, pelo meme que viralizou na internet, pelo bordão que se aprendeu na telenovela. Ao ver no último domingo num telejornal as imagens tristes do enterro da menina Ághata, a gente percebe um pouco do horror do que é viver numa comunidade fragilizada socialmente e de como uma parte significativa de quem lá vive sofre diariamente profunda violação de direitos humanos.
Imaginar que uma criança, que more numa comunidade, não possa fazer com segurança um trajeto de casa para escola, da escola para um parque, do parque para casa, sem estar sujeita às rajadas de bala, e a perder a vida de uma forma violenta e banal é um horror. Certa vez encontrei numa viagem de passeio uma jovem enfermeira que se apresentou assim para mim: eu sou uma sobrevivente do Complexo do Alemão. Fiquei desnorteada. Porque embora a gente escute os noticiários e a regularidade com que trazem os relatos de violência urbana em nosso País, a consciência dos habitantes que vivem nas comunidades que mais sofrem, que são mais atingidas com a violência urbana é muito clara.
Quando eu olho para uma criança muito pequena sempre me espanto, olho para dentro de mim e desejo tudo de bom para ela, porque a vejo como um começo, uma possibilidade. Me pergunto interiormente, o que ela vai se tornar, e torço para que sua vida e trajetória tragam o melhor para ela e para esse mundo. Quando eu me deparo com a morte violenta de crianças, seja num percurso migratório, seja pela fome, desnutrição, catástrofes ambientais, seja pela violência intra-familiar, seja numa comunidade ou em qualquer lugar do mundo, eu rogo por salvação, por mudança.
Sei que nada vai mudar a dor da mãe e do pai de Ághata diante de sua ausência, de sua vida interrompida. Caso encontrasse com eles não saberia sequer dizer qualquer palavra de conforto, porque acho que elas simplesmente não existem para situações como estas. Acho que apenas somaria às lágrimas.
O que eu sinto com a morte violenta de Ághata é uma profunda vergonha do Brasil, de seus governantes insensíveis, alheios às perdas humanas de sua Nação. E lamento pelos meus compatriotas, grande parte indiferente às profundas desigualdades produtoras de tanto sofrimento.
E sonho com o momento em que a violência urbana deixe de ser naturalizada diariamente no consumo de informação que só banaliza as mortes e o sofrimento humano.
Eu carrego em mim muitos sonhos relacionados às crianças pela potência que trazem em si. Muitos relacionados a efetivação de seus direitos mais fundamentais: a criança será protegida e terá desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social adequados; as crianças estarão, em qualquer circunstância, entre os primeiros a receber proteção e socorro; a criança será protegida contra qualquer crueldade e exploração…
Ághata é um nome feminino que vem do grego (Aghate ou Aghatós), que significa “boa, perfeita, respeitável e virtuosa”. Ághata foi uma menina de 8 anos, muito amada, inocente, que de dança e fazia balé, e que, segundo o noticiário, foi morta por tiro de fuzil, de acordo com informações veiculadas pela imprensa, infelizmente, a décima sexta criança vítima de violência armada.
Esse tipo de informação fere. Dói muito. Fiquei espantada ainda por perceber uma certa inércia social e silenciamento, diante de mais uma morte violenta, que passa, cada vez mais, a ser percebida socialmente como estatística. Ou nada além de uma crescente numérica. Talvez a dificuldade de mobilização social para enfrentar questões como esta seja um forte sintoma de anomia, de declínio da organização social e da condição do Estado de garantir proteção.
Porque na verdade, no cotidiano eu percebo muita comoção e engajamento das pessoas pelos times de futebol, pela dança que virou febre, pelo meme que viralizou na internet, pelo bordão que se aprendeu na telenovela. Ao ver no último domingo num telejornal as imagens tristes do enterro da menina Ághata, a gente percebe um pouco do horror do que é viver numa comunidade fragilizada socialmente e de como uma parte significativa de quem lá vive sofre diariamente profunda violação de direitos humanos.
Imaginar que uma criança, que more numa comunidade, não possa fazer com segurança um trajeto de casa para escola, da escola para um parque, do parque para casa, sem estar sujeita às rajadas de bala, e a perder a vida de uma forma violenta e banal é um horror. Certa vez encontrei numa viagem de passeio uma jovem enfermeira que se apresentou assim para mim: eu sou uma sobrevivente do Complexo do Alemão. Fiquei desnorteada. Porque embora a gente escute os noticiários e a regularidade com que trazem os relatos de violência urbana em nosso País, a consciência dos habitantes que vivem nas comunidades que mais sofrem, que são mais atingidas com a violência urbana é muito clara.
Quando eu olho para uma criança muito pequena sempre me espanto, olho para dentro de mim e desejo tudo de bom para ela, porque a vejo como um começo, uma possibilidade. Me pergunto interiormente, o que ela vai se tornar, e torço para que sua vida e trajetória tragam o melhor para ela e para esse mundo. Quando eu me deparo com a morte violenta de crianças, seja num percurso migratório, seja pela fome, desnutrição, catástrofes ambientais, seja pela violência intra-familiar, seja numa comunidade ou em qualquer lugar do mundo, eu rogo por salvação, por mudança.
Sei que nada vai mudar a dor da mãe e do pai de Ághata diante de sua ausência, de sua vida interrompida. Caso encontrasse com eles não saberia sequer dizer qualquer palavra de conforto, porque acho que elas simplesmente não existem para situações como estas. Acho que apenas somaria às lágrimas.
O que eu sinto com a morte violenta de Ághata é uma profunda vergonha do Brasil, de seus governantes insensíveis, alheios às perdas humanas de sua Nação. E lamento pelos meus compatriotas, grande parte indiferente às profundas desigualdades produtoras de tanto sofrimento.
E sonho com o momento em que a violência urbana deixe de ser naturalizada diariamente no consumo de informação que só banaliza as mortes e o sofrimento humano.
Eu carrego em mim muitos sonhos relacionados às crianças pela potência que trazem em si. Muitos relacionados a efetivação de seus direitos mais fundamentais: a criança será protegida e terá desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social adequados; as crianças estarão, em qualquer circunstância, entre os primeiros a receber proteção e socorro; a criança será protegida contra qualquer crueldade e exploração…
Ághata é um nome feminino que vem do grego (Aghate ou Aghatós), que significa “boa, perfeita, respeitável e virtuosa”. Ághata foi uma menina de 8 anos, muito amada, inocente, que de dança e fazia balé, e que, segundo o noticiário, foi morta por tiro de fuzil, de acordo com informações veiculadas pela imprensa, infelizmente, a décima sexta criança vítima de violência armada.
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