07 de setembro de 2020 -- Tribunal de INjustiça da Paraíba

                         Imagem de José Baptista de Mello - Perseguido pela Ditadura Militar.

Por José Baptista de Mello Neto*

 Hoje, 07 de setembro de 2020, dia que se comemora a "Independência" do Brasil, convido Minhas Amigas e Meus Amigos do facebook para uma reflexão sobre FATOS da história do Tribunal de INjustiça da Paraíba, que me dá náuseas, ânsia de vômito e, sobremodo, tristeza.

Me refiro a um episodio da história do T(IN)J/PB: a cassação de 11 (ONZE) Magistrados/as, em 27 de fevereiro de 1969.
Me desculpem por um texto relativamente longo para os padrões do face, mas é necessário compartilhar um mínimo de informações sobre esse fato.
Em 1964, o golpe militar que depôs o Presidente da República, logo seguido pelo Ato Institucional – o primeiro, ainda sem número – que previa punições para magistrados, parlamentares e servidores públicos civis e militares.
Correu a notícia que Ministros do Supremo Tribunal Federal seriam punidos. O Presidente do Pretório Excelso, o grande Ministro Ribeiro da Costa fez saber ao general que então ocupava a Presidência da República que, se algum integrante da Corte fosse atingido, ele pessoalmente atravessaria a Praça dos Três Poderes e entregaria a chave do Supremo ao Presidente da República. O mais alto Tribunal do país foi poupado; o mesmo, porém, não aconteceu nas instâncias inferiores. Em diversos Estados desembargadores e juízes foram demitidos, aposentados compulsoriamente ou postos em disponibilidade. Na Paraíba, foi afastado o juiz de Rio Tinto, Hermilo Ximenes, o primeiro magistrado paraibano atingido pelo arbítrio.
No dia 21 de fevereiro de 1969, foi publicada em vários órgãos da imprensa brasileira uma nota do gabinete do Ministro da Justiça, dando conta de que o titular da pasta encaminhara ao Presidente da República ofício do governador da Paraíba, acompanhado de expediente do presidente do Tribunal de Justiça do Estado, pedindo a aposentadoria compulsória de 11 Juíz@s de Direito que, por fatos apurados em sindicâncias, inquéritos e correições, revelavam comportamento inadequado à magistratura.
Essa nota chamou a atenção de todo o país. Tratava-se de algo absolutamente inédito e, depois, nunca repetido. Os atos punitivos vinham de súbito, sem nenhum aviso prévio. Não demorou a surgir uma explicação.
O ministro queria fixar as responsabilidades pelo ato. Interessante registrar a afirmação do coronel Ubirajara Vinagre, então chefe da representação do Serviço Nacional de Informações na Paraíba: “Nós não temos nada com isso! Fomos tão surpreendidos como vocês! Se esse governador queria mostrar serviço deveria começar por limpar o terreiro da casa dele!”
Depois, outro coronel, que servia no gabinete do Ministro do Exército, procurou, por iniciativa própria, inteirar-se do que tinha havido. Conversou com um colega de farda que servia no gabinete do Ministro da Justiça – em todos os gabinetes ministeriais havia uma Assessoria de Segurança e Informação vinculada ao SNI e chefiada por um coronel – e que lhe contou que o governador da Paraíba fora ao gabinete ministerial conduzindo pessoalmente o ofício. Quatro dias depois, lá retornou para saber do encaminhamento. O ministro lhe respondeu que sobre dois ou três havia indícios que poderiam levar à instauração de um inquérito e que, quanto aos demais nada havia que não pudesse ser resolvido através de vias administrativas. O governador retrucou-lhe que não viera pedir abertura de inquérito ministerial, mas exigir a punição dos onze.
O Ministro da Justiça Gama e Silva imediatamente percebeu que o governante paraibano queria se esconder atrás de um respaldo federal para atingir seus interesses pessoais. Daí a nota fixadora das responsabilidades pelo ato punitivo.
Convém registrar que o próprio João Agripino posteriormente, em depoimento, confirmou sua inteira responsabilidade sobre o encaminhamento da cassação de 10 Juízes e 01 Juíza de Direito. (Ver em Rio de Janeiro: CPDOC/Fundação Getúlio Vargas, 284).
O que foi apurado nas sindicâncias, inquéritos e correições alegados pelo Tribunal de (IN)justiça da Paraíba nunca foi dado a conhecer. Muito menos os/as Magistrados/as tiveram qualquer direito de defesa. Anos depois, quando ocupava a Presidência da Casa o Desembargador Aurélio de Albuquerque, um dos Juízes que havia sido cassado, Humberto Cavalcanti de Mello (Meu Pai) requereu e obteve uma certidão de que contra ele nunca fora aberto qualquer inquérito ou sindicância, nem se realizara qualquer correição nas comarcas em que ele atuou enquanto Magistrado.
Cabe ressaltar que a iniciativa do Tribunal de (IN)justiça da Paraíba, de pedir punição para juízes do seu Estado, teve repercussão extremamente negativa em todo o Judiciário Nacional. Nas demais unidades da Federação, os Tribunais procuravam defender os/as integrantes das respectivas magistraturas, ao invés do que aqui sucedeu. A posição tomada pelo Tribunal paraibano só fez aumentar a dor e o sofrimento pela punição recebida. Houve manifestações de desagrado em alguns Tribunais.
Dez anos se passaram e veio a anistia, por uma lei de iniciativa do Presidente da República. Houve uma interpretação inicial por parte de alguns componentes desse Tribunal de (IN)justiça no sentido de que os/as Magistrados/as não poderiam ser beneficiados pela anistia porque ela se referia a funcionários públicos e os/as magistrados/as eram membros de um poder. A exegese absurda teve de ser abandonada visto que os demais Tribunais se apressaram em reintegrar os magistrados que tinham sido punidos. Em alguns casos, beneficiando-os. O Tribunal do Rio de Janeiro, verificando que o juiz Osni Duarte Pereira,pelo tempo decorrido, já seria desembargador, reintegrou-o como integrante da Corte. No Tribunal do Distrito Federal, o paraibano Geraldo Irinêo Joffily, demitido pelo primeiro Ato Institucional, teria sido Presidente da Corte, não fora a punição. Ao reintegrá-lo, observando que ele já estava próximo dos setenta anos, a mesa do Tribunal renunciou, a fim de que ele pudesse ser eleito presidente.
Não houve jeito. O Tribunal de (IN)justiça da Paraíba teve que reintegrar tod@s . Mas posso dizer, usando uma linguagem popular, que foram “engolidos à força”. Dois fatos o comprovam: a sessão que deveria apreciar os pedidos de Anistia e reintegração dos/as Magistrados/as atingidos pelos atos de exceção foi adiada por uma semana. Nesse intervalo, abriu-se mais uma vaga na primeira entrância em vista da remoção de um juiz, mas o Tribunal de (IN)justiça da Paraíba negou a reintegração do Magistrado Severino Ramos, sob a alegação de que não existia nenhuma vaga. A mesma alegação embasou a recusa de volta do desembargador Emílio Farias, aposentado dois meses depois dos 11 primeiros/as.
Com a Magistrada Helena Alves de Souza aconteceu pior: ela, que já era Juíza de Segunda Entrância, foi reintegrada na Comarca de Uiraúna, de Primeira.
A Lei de Anistia determinava que o tempo de afastamento fosse contado. @s Magistrad@s cassad@s requereram que esse tempo fosse contado para efeito de antiguidade na Entrância. Todos os requerimentos foram indeferidos. Somente poderiam contar o tempo para a aposentadoria. Um d@s cassad@s ouviu de um desembargador: “Vocês podem fazer o melhor, serem os mais produtivos, prolatarem as sentenças mais bem juridicamente fundamentadas, mas nunca serão promovidos por merecimento. Talvez por antiguidade, e olhe lá!”
Me pergunto quando teremos um Tribunal que faça Justiça na Paraíba, naquilo que diz respeito às Pessoas que foram perseguidas pela Ditadura Militar e seus asseclas civis?
Quando o T(I)j/PB irá se retratar publicamente com essas Pessoas?
Quanto o T(I)j/PB irá pedir desculpas a essas Pessoas pelas perseguições que elas sofreram;
Quanto do T(I)j/PB irá reconhecer seu erro e pedir desculpas a essas Pessoas pelas injustiças, mentiras e armações que foram vítimas?
Quando o T(I)j/PB irá admitir publicamente que NUNCA houve nada que desabonasse a conduta, a honra, a ética e a postura profissional dessas Pessoas?
*José Baptista de Mello Neto, Prof. Dr. da UEPB Campus III. Departamento de Direito.

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